LEI Nº 6.107, DE 31 DE OUTUBRO DE 2023
Projeto de Lei nº 92/2023
Autora: Prefeita Municipal Pétala Gonçalves Lacerda
CRIA O PROGRAMA MUNICIPAL DE RESTAURAÇÃO E CONSERVAÇÃO FLORESTAL E DÁ OUTRAS PROVIDÊNCIAS.
PÉtala Gonçalves Lacerda, PREFEITA MUNICIPAL DE CAÇAPAVA, ESTADO DE SÃO PAULO, no uso de suas atribuições legais, faço saber que a Câmara Municipal aprovou e eu sanciono e promulgo a seguinte Lei nº 6107.
CAPÍTULO I
DISPOSIÇÕES GERAIS
Art. 1º Esta Lei define conceitos, objetivos, diretrizes, ações e critérios para o Programa Municipal de Restauração e Conservação Florestal (PMRCF) e para o Cadastro Municipal de Pagamento por Serviços Ambientais (CMPSA) e, dispõe sobre os contratos de pagamento por serviços ambientais e sobre a não incidência do Imposto sobre Serviços.
Art. 2º Para os efeitos desta lei, consideram-se:
I - Ecossistema: complexo dinâmico de comunidades vegetais, animais e de microrganismos e o seu meio inorgânico que interagem como uma unidade funcional;
II - Restauração ambiental: o processo pelo qual são promovidas intervenções, para a recomposição dos processos funcionais de determinado ecossistema degradado, de modo a retornar ao processo sucessional natural, conforme as condições edáficas e climáticas de determinado local;
III - Restauração florestal: processo de reconstrução gradual da floresta, que foi degradada ou completamente destruída, em direção à integridade e sustentabilidade do ecossistema ao longo do tempo;
IV - Conservação florestal: manutenção das áreas de florestas nativas existentes, visando a continuidade dos processos naturais em direção à integridade e sustentabilidade do ecossistema ao longo do tempo;
V - Serviços ecossistêmicos: benefícios relevantes para a sociedade gerados pelos ecossistemas, em termos de manutenção, recuperação ou melhoria das condições ambientais, nas seguintes modalidades:
a) Serviços de provisão: os que fornecem bens ou produtos ambientais utilizados pelo ser humano para consumo ou comercialização, tais como água, alimentos, madeira, fibras e extratos, entre outros;
b) Serviços de suporte: os que mantêm a perenidade da vida na Terra, tais como a ciclagem de nutrientes, a decomposição de resíduos, a produção, a manutenção ou a renovação da fertilidade do solo, a polinização, a dispersão de sementes, o controle de populações de potenciais pragas e de vetores potenciais de doenças humanas, a proteção contra a radiação solar ultravioleta e a manutenção da biodiversidade e do patrimônio genético;
c) Serviços de regulação: os que concorrem para a manutenção da estabilidade dos processos ecossistêmicos, tais como o sequestro de carbono, a purificação do ar, a moderação de eventos climáticos extremos, a manutenção do equilíbrio do ciclo hidrológico, a minimização de enchentes e secas e o controle dos processos críticos de erosão e de deslizamento de encostas;
d) Serviços culturais: os que constituem benefícios não materiais providos pelos ecossistemas, por meio da recreação, do turismo, da identidade cultural, de experiências espirituais e estéticas e do desenvolvimento intelectual, entre outros;
VI - Serviços ambientais: atividades individuais ou coletivas que favorecem a manutenção, a recuperação ou a melhoria dos serviços ecossistêmicos;
VII - Pagamento por serviços ambientais: transação de natureza voluntária, mediante a qual um pagador de serviços ambientais transfere a um provedor desses serviços recursos financeiros ou outra forma de remuneração, nas condições acertadas, respeitadas as disposições legais e regulamentares pertinentes;
VIII - Pagador de serviços ambientais: poder público, organização da sociedade civil ou agente privado, pessoa física ou jurídica, de âmbito nacional ou internacional, que provê o pagamento dos serviços ambientais nos termos do inciso IV deste caput;
IX - Provedor de serviços ambientais: pessoa física ou jurídica, de direito público ou privado, ou grupo familiar ou comunitário que, preenchidos os critérios de elegibilidade, mantém, recupera ou melhora as condições ambientais dos ecossistemas.
CAPÍTULO II
DO PROGRAMA MUNICIPAL DE RESTAURAÇÃO E CONSERVAÇÃO FLORESTAL (PMRCF)
Seção I
Dos Objetivos e das Diretrizes do PMRCF
Art. 3º Fica instituído o Programa Municipal de Restauração e Conservação Florestal (PMRCF), denominado Programa “+ Floresta e Água” no âmbito da Secretaria Municipal de Planejamento Urbano e Meio Ambiente.
§ 1º O PMRCF tem os seguintes objetivos:
I - orientar a atuação do poder público, das organizações da sociedade civil e dos agentes privados em relação à restauração florestal, à conservação florestal e ao pagamento por serviços ambientais, de forma a manter, recuperar ou melhorar os serviços ecossistêmicos no Município de Caçapava;
II - estimular a restauração e a conservação dos ecossistemas, dos recursos hídricos, do solo, da biodiversidade, do patrimônio genético e do conhecimento tradicional associado;
III - valorizar econômica, social e culturalmente os serviços ecossistêmicos;
IV - evitar a perda de vegetação nativa, a fragmentação de habitats, a desertificação e outros processos de degradação dos ecossistemas nativos e fomentar a conservação sistêmica da paisagem;
V - incentivar medidas para garantir a segurança hídrica;
VI - contribuir para a regulação do clima e a redução de emissões advindas de desmatamento e degradação florestal;
VII - reconhecer as iniciativas individuais ou coletivas que favoreçam a manutenção, a recuperação ou a melhoria dos serviços ecossistêmicos, por meio de retribuição monetária ou não monetária, prestação de serviços ou outra forma de recompensa, como o fornecimento de produtos ou equipamentos;
VIII - contribuir para a manutenção da qualidade e para o saneamento dos corpos hídricos;
IX - fomentar o desenvolvimento sustentável.
§ 2º São diretrizes do PMRCF:
I - o atendimento aos princípios do provedor-recebedor e do usuário-pagador;
II - o reconhecimento de que a manutenção, a recuperação e a melhoria dos serviços ecossistêmicos contribuem para a qualidade de vida da população;
III - a utilização do pagamento por serviços ambientais como instrumento de promoção do desenvolvimento social, ambiental, econômico e cultural das populações em área rural e dos produtores rurais;
IV - a complementaridade do pagamento por serviços ambientais em relação aos instrumentos de comando e controle relacionados à conservação do meio ambiente;
V - a integração e a coordenação das políticas de meio ambiente, de recursos hídricos, de agricultura, de energia, de transporte, de desenvolvimento urbano, entre outras, com vistas à manutenção, à recuperação ou à melhoria dos serviços ecossistêmicos;
VI - a publicidade, a transparência e o controle social nas relações entre o pagador e o provedor dos serviços ambientais prestados;
VII - a adequação do imóvel rural, periurbano e urbano à legislação ambiental;
VIII - o aprimoramento dos métodos de monitoramento, de verificação, de avaliação e de certificação dos serviços ambientais prestados;
IX - o resguardo da proporcionalidade no pagamento por serviços ambientais prestados.
§ 3º A contratação do pagamento por serviços ambientais no âmbito do PMRCF, priorizará a importância ecológica da área.
§ 4º Na execução do PMRCF, o órgão gestor poderá realizar parcerias com cooperativas, associações civis e outras formas associativas que permitam dar escala às ações a serem implementadas.
§ 5º São requisitos gerais para participação no PMRCF:
I - enquadramento em uma das ações definidas para o Programa;
II - nos imóveis privados, comprovação de uso ou ocupação regular do imóvel e, no caso de imóveis rurais, inscrição no Cadastro Ambiental Rural (CAR);
III - formalização de contrato específico;
IV - outros estabelecidos em regulamento.
§ 6º O contrato de pagamento por serviços ambientais pode ocorrer por termo de adesão, na forma de regulamento.
§ 7º No âmbito do PMRCF, o pagamento por serviços ambientais depende de verificação e comprovação das ações de restauração ambiental, restauração florestal, conservação florestal ou de saneamento de corpos hídricos da área objeto de contratação, conforme regulamento.
Seção II
Das Ações do PMRCF
Art. 4º O PMRCF promoverá ações de:
I - conservação e restauração de ecossistemas no ambiente natural em áreas rurais, periurbanas e Áreas de Preservação Permanente (APP);
II - conservação e melhoria da quantidade e da qualidade da água, especialmente em bacias hidrográficas com cobertura vegetal importantes para o abastecimento humano e para a dessedentação animal ou em áreas sujeitas a risco de desastre;
III - recuperação e recomposição da cobertura vegetal nativa de áreas degradadas, por meio do plantio de espécies nativas ou por sistema agroflorestal;
IV - boas práticas agrícolas e ambientais, agroflorestais e agrossilvopastoris que contribuam para conservação do solo, da água e da biodiversidade.
Seção III
Dos Critérios de Aplicação do PMRCF
Art. 5º Podem ser objeto do PMRCF:
I - áreas cobertas com vegetação nativa;
II - áreas sujeitas a restauração ecossistêmica, a recuperação da cobertura vegetal nativa ou a plantio agroflorestal;
III - unidades de conservação de proteção integral e uso sustentável;
IV - paisagens de grande beleza cênica, prioritariamente em áreas especiais de interesse turístico;
V - Áreas prioritárias para conservação indicadas pelo Plano Municipal da Mata Atlântica e Cerrado.
Art. 6º Em relação aos imóveis privados, são elegíveis para provimento de serviços ambientais:
I - os situados em zona rural inscritos no CAR, previsto na Lei Federal nº 12.651, de 25 de maio de 2012;
II - os situados em zona periurbana que estejam em conformidade com o Plano Diretor;
III - Unidades de Conservação, áreas das zonas de amortecimento e corredores ecológicos cobertas por vegetação nativa, nos termos da Lei Federal nº 9.985, de 18 de julho de 2000.
Parágrafo único. As Áreas de Preservação Permanente, Reserva Legal e outras sob limitação administrativa, nos termos da legislação ambiental, serão elegíveis para pagamento por serviços ambientais com uso de recursos públicos, conforme regulamento. Poderão ter preferência aquelas localizadas em bacias hidrográficas consideradas prioritárias para o abastecimento público de água, assim definidas pelo órgão competente, ou em áreas prioritárias para conservação da biodiversidade.
Art. 7º É vedada a aplicação de recursos públicos para pagamento por serviços ambientais:
I - a pessoas físicas e jurídicas inadimplentes em relação a termo de ajustamento de conduta ou de compromisso firmado com os órgãos competentes com base nas Leis Federais 7.347, de 24 de julho de 1985, e 12.651, de 25 de maio de 2012;
II - referente a áreas embargadas pelos órgãos do Sisnama, conforme disposições da Lei Federal nº 12.651, de 25 de maio de 2012.
Seção IV
Do Contrato de Pagamento por Serviços Ambientais
Art. 8º O regulamento definirá as cláusulas essenciais para cada tipo de contrato de pagamento por serviços ambientais, consideradas obrigatórias aquelas relativas:
I - aos direitos e às obrigações do provedor, incluídas as ações de manutenção, de recuperação e de melhoria ambiental do ecossistema por ele assumidas e os critérios e os indicadores da qualidade dos serviços ambientais prestados;
II - aos direitos e às obrigações do pagador, incluídos as formas, as condições e os prazos de realização da fiscalização e do monitoramento;
III - às condições de acesso, pelo poder público, à área objeto do contrato e aos dados relativos às ações de manutenção, de recuperação e de melhoria ambiental assumidas pelo provedor, em condições previamente pactuadas e respeitados os limites do sigilo legal ou constitucionalmente previsto.
Art. 9º Os contratos de pagamento por serviços ambientais que envolvam recursos públicos ou que sejam objeto dos incentivos tributários estarão sujeitos à fiscalização pelos órgãos competentes do poder público.
Parágrafo único. Os serviços ambientais prestados podem ser submetidos à validação ou à certificação por entidade técnico-científica independente, na forma do regulamento.
Seção V
Da Governança
Art. 10 O PMRCF contará com uma instância gestora do projeto (IGP), com atribuição de:
I - acompanhar a execução do PMRCF;
II - arbitrar, em primeira instância administrativa, na resolução de conflitos relacionados à execução do PMRCF;
III - propor prioridades e critérios de aplicação dos recursos do PMRCF;
IV - monitorar a conformidade dos investimentos realizados pelo PMRCF com os objetivos e as diretrizes da PMRCF, bem como propor os ajustes necessários à implementação do Programa;
V - avaliar, periodicamente, o PMRCF e sugerir as adequações necessárias ao Programa;
VI - manifestar-se, anualmente, sobre o plano de aplicação de recursos do PMRCF e sobre os critérios de métrica de valoração, de validação, de monitoramento, de verificação e de certificação dos serviços ambientais utilizados pelos órgãos competentes.
§ 1º A IGP será composta por representantes de instituições públicas e privadas, comprometidas com o desenvolvimento do PMRCF e será presidida pelo titular do órgão municipal que tem por atribuição o desenvolvimento da política ambiental ou por quem ele indicar.
§ 2º As instituições que fundarão a IGP serão definidas em regulamento e posteriormente poderão deliberar pela participação de novos membros segundo demonstração de interesse enviada à IGP.
§ 3º A participação na IGP é considerada de relevante interesse público e não será remunerada.
§ 4º O funcionamento da IGP será regulado por seu Regimento Interno.
CAPÍTULO III
DO CADASTRO MUNICIPAL DE PAGAMENTO POR SERVIÇOS AMBIENTAIS (CMPSA)
Art. 11 Fica instituído o Cadastro Municipal de Pagamento por Serviços Ambientais (CMPSA), mantido pelo órgão municipal que tem por atribuição o desenvolvimento da política ambiental, que conterá, no mínimo, os contratos de pagamento por serviços ambientais realizados que envolvam agentes públicos e privados, as áreas potenciais e os respectivos serviços ambientais prestados e as metodologias e os dados que fundamentaram a valoração dos ativos ambientais, bem como as informações sobre os planos, programas e projetos que integram o PMPSA.
Parágrafo único. São objetivos do CMPSA:
I - incentivar a criação de um mercado de serviços ambientais;
II - estabelecer mecanismos de gestão de dados e informações necessários à implantação e ao monitoramento de ações para a plena execução dos serviços ambientais.
CAPÍTULO IV
DOS RECURSOS FINANCEIROS E INCENTIVOS
Seção I
Dos Recursos Financeiros
Art. 12 Os recursos financeiros para a implementação do PMRCF poderão vir das seguintes fontes:
I - recursos da cobrança pelo uso da água, destinados pelo Comitê de Bacia Hidrográfica;
II - recursos da tarifa dos serviços de saneamento básico;
III - recursos oriundos da análise de processo de licenciamento municipal;
IV - editais de apoio a projetos socioambientais;
V - multas impostas a infratores da legislação ambiental;
VI - doações, empréstimos e transferências de instituições nacionais ou internacionais, públicas ou privadas;
VII - doações de pagadores por serviços ambientais, efetuadas com a finalidade específica de remunerar serviços ambientais de que se beneficiem;
VIII - remuneração oriunda da fixação e sequestro de carbono;
IX - dotação orçamentária do Estado destinado para o Programa;
X - recursos oriundos do ICMS Ecológico;
XI - recursos oriundos do Fundo Municipal de Meio Ambiente, criado pela Lei Municipal nº 4.814/2009;
XII - Royalties de diversas fontes que incidem sobre o território municipal;
XIII - outras fontes ou fundos a serem criados ou já existentes para tal finalidade.
Seção II
Dos Incentivos
Art. 13 O Imposto Sobre Serviços (ISS) não incide sobre os serviços ecossistêmicos e ambientais de que trata esta Lei, no âmbito territorial do município.
CAPÍTULO V
DISPOSIÇÕES FINAIS
Art. 14 Para o cumprimento do disposto nesta Lei, o Município poderá firmar parcerias com instituições públicas e privadas.
Art. 15 As obrigações constantes de contratos de pagamento por serviços ambientais, quando se referirem à conservação ou restauração da vegetação nativa em imóveis particulares, ou mesmo à adoção ou manutenção de determinadas práticas agrícolas, agroflorestais ou agrossilvopastoris, têm natureza propter rem e devem ser cumpridas pelo adquirente do imóvel nas condições estabelecidas contratualmente.
Art. 16 Caso haja venda da propriedade durante a vigência do contrato, o proprietário atual deve informar ao Órgão Municipal ambiental sobre a venda do mesmo, bem como indicar o novo proprietário do imóvel, além de obrigatoriamente realizar a comunicação ao novo proprietário sobre suas responsabilidades, ou a rescisão contratual com o programa.
Art. 17 A Secretaria de Planejamento Urbano e Meio Ambiente, por meio do Departamento de Meio Ambiente (DMA) elaborará normas necessárias para a implementação do PMRCF e o poder executivo regulamentará esta Lei no que couber.
Art. 18 Esta lei entrará em vigor na data de sua publicação, revogadas as disposições em contrário.
Prefeitura Municipal de Caçapava, 31 de outubro de 2023.
PÉTALA GONÇALVES LACERDA
PREFEITA MUNICIPAL
Este texto não substitui o original publicado e arquivado na Câmara Municipal de Caçapava.